
Lula em Nova York: encontros estratégicos, Palestina e críticas às sanções dos EUA
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva desembarcou na cidade no fim da tarde deste domingo (21) para abrir a reunião de líderes da 80ª Assembleia Geral das Nações Unidas. Desde 1955, é tradição que o Brasil seja o primeiro país a discursar na abertura do debate geral — uma prática reconhecida pelo secretariado da ONU como “estabelecida”.
Luciana Rosa, correspondente da RFI em Nova York
O presidente brasileiro tem uma agenda intensa durante os três dias em que estará nos Estados Unidos: encontros bilaterais com empresas de tecnologia, participação em uma reunião sobre a proposta de dois Estados para o conflito no Oriente Médio e articulações para a COP30, que será realizada em Belém, em novembro.
O ponto mais delicado da viagem, no entanto, é a expectativa de um eventual encontro com representantes do governo americano. As relações entre Brasília e Washington estão tensas desde abril deste ano, quando os Estados Unidos anunciaram tarifas de 50% sobre produtos brasileiros como aço, alumínio e café.
Audiência com o diretor-executivo do TikTok
A agenda do presidente brasileiro em Nova York começa de forma intensa nesta segunda-feira (22). Lula tem duas bilaterais confirmadas: uma audiência com o diretor-executivo do TikTok, Shou Zi Chew, e, no final do dia, um encontro com o rei Carl XVI Gustaf e a rainha Sílvia da Suécia.
À tarde, ele participa da Conferência de Alto Nível para a Solução Pacífica da Questão Palestina, no plenário da Assembleia Geral da ONU.
Na terça-feira (23), acontece a abertura oficial da Assembleia. Lula terá um breve encontro com o secretário-geral António Guterres às 8h40 e, em seguida, participa da sessão de abertura. O Brasil é tradicionalmente o terceiro país a discursar, mas o presidente será o primeiro chefe de Estado a subir ao púlpito.
À tarde, o destaque será a reunião sobre o Fundo de Florestas Tropicais e Financiamento Climático (TFFF) — um mecanismo que deve ser lançado oficialmente durante a COP30, em Belém.
Na quarta-feira (24), os compromissos incluem a Segunda Reunião em Defesa da Democracia e no Combate ao Extremismo e, mais tarde, a abertura de um evento especial sobre clima, organizado pelo secretário-geral da ONU.
Segundo fontes ligadas à organização da agenda, mais de 30 líderes mundiais solicitaram encontros bilaterais com o presidente brasileiro. Entre eles está o ucraniano Volodymyr Zelensky, cuja reunião ainda não foi confirmada.
A comitiva que acompanha o presidente Lula é composta pelos ministros Ricardo Lewandowski (Justiça), Camilo Santana (Educação), Márcia Lopes (Mulheres) e Sônia Guajajara (Povos Indígenas), além do governador do Ceará, Elmano de Freitas. O assessor especial Celso Amorim também integra a delegação presidencial.
Já a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e o chanceler Mauro Vieira chegaram antes a Nova York para atividades ligadas à Semana do Clima e para preparar a agenda presidencial.
Reconhecimento do Estado Palestino
Lula será o segundo presidente a discursar na Conferência Internacional de Alto Nível para a Solução Pacífica da Questão da Palestina e a Implementação da Solução de Dois Estados, que acontece nesta segunda-feira (22).
O Itamaraty avalia que o encontro pode ser uma oportunidade para ampliar o reconhecimento da Palestina como Estado. Segundo levantamento da agência AFP, atualmente, 147 países já reconhecem a Autoridade Palestina, incluindo o Brasil. A primeira sessão dessa conferência ocorreu em julho, e desde então houve avanços importantes.
Neste domingo (21), por exemplo, Reino Unido, Canadá e Austrália anunciaram o reconhecimento da Palestina, ampliando a pressão internacional. A expectativa é de que a França também formalize esse reconhecimento durante a conferência — um gesto significativo, já que o país é um dos organizadores, ao lado da Arábia Saudita.
Por outro lado, Israel e os Estados Unidos continuam rejeitando o reconhecimento da Palestina como Estado, o que mantém o impasse diplomático em torno da chamada solução de dois Estados.
Encontro com Donald Trump
Apesar de os dois presidentes discursarem em sequência — Trump sobe ao palco logo após Lula encerrar seu discurso —, segundo a logística da cerimônia, não há chance de que os dois mandatários se encontrem, a menos que haja uma intenção explícita de alguma das partes. O tempo entre os discursos é muito curto, e a organização da Assembleia mantém uma circulação restrita nos bastidores.
Na agenda oficial do presidente brasileiro, também não há previsão de reunião com o governo americano para discutir as tarifas ou outros temas bilaterais.
O que esperar do discurso?
O tema central escolhido pela presidente da Assembleia deste ano é “Melhor juntos: 80 anos e mais pela paz, pelo desenvolvimento e pelos direitos humanos”. Nesse contexto, Lula deve usar o púlpito da ONU para defender o multilateralismo, a soberania dos países e uma solução pacífica para o conflito no Oriente Médio. Fontes do governo indicam que ele vai reforçar críticas às sanções impostas pelos Estados Unidos, incluindo tarifas comerciais e punições previstas na Lei Magnitsky, além de destacar a importância de reformas nas Nações Unidas para garantir representatividade e eficácia.
O presidente também deve retomar compromissos assumidos no Pacto para o Futuro, assinado na Assembleia de 2024, e no Chamado à Ação do G20, que propõem mudanças na governança global.
A defesa da solução de dois Estados para a Palestina, já tradicional na diplomacia brasileira, deve aparecer com força no discurso. Mas a grande novidade desta vez será a ênfase nas críticas às medidas unilaterais americanas, marcando um tom mais firme nas relações entre Brasília e Washington.
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